SOBRE A TÉCNICA DE CONSTRUÇÃO DE IMAGENS

O Pensamento em Imagens

No nível atual da investigação neurofisiológica e com a constatação empírica das alterações derivadas da comissuroctomia (separação cirúrgica do corpo caloso que conecta as duas metades do cérebro), é possível afirmar que ambos os hemisférios cerebrais são, no sentido estrito, dois cérebros com funções diferentes.
O hemisfério esquerdo (ou direito, nos canhotos) produz a linguagem verbal e traduz as percepções e respresentações lógico - analíticas como a leitura, escrita, o cálculo e comunica-se com a realidade tendo como base esta informação.
Entre as funções do hemisfério cerebral direito (ou esquerdo, nos canhotos), estão as seguintes:
Compreensão unitária de jogos complexos, configurações e estruturas
Percepção de uma figura a partir de diversos ângulos e perspectivas.
Compreensão do todo se baseando em uma de suas partes (como reconhecer uma sinfonia pelo compasso ou evocar uma situação pela sensação olfativa).
Construção abstrata dos jogos e dos conceitos lógicos, que permite agrupar e ordenar a enorme diversidade do mundo.
O hemisfério direito é atemporal, entretanto é predominante quanto à concepção do espaço. Suas associações não são lineares e sua linguagem é arcaica e pouco desenvolvida carecendo de gramática, sintaxe e semântica. Algumas de suas manifestações são encontradas na sintomatologia esquizofrênica: conceitos ambivalentes, mistura entre o concreto o e o metafórico, condensações, neologismos, etc.
Cada hemisfério cerebral possui sua própria linguagem. Correspondem ao hemisfério esquerdo formas como a lógica, a análise, a objetividade, as definições, as interpretações e as explicações; trata-se de uma linguagem racional e científica. No hemisfério direito, pelo contrário, a linguagem consiste imagens, metáforas, espaços, símbolos e totalidades que são extraídas de sonhos e fantasias, experiências e elementos internos da aprendizagem intuitiva do tipo sensorial, corporal e espacial.
Watslavick diz ("El lenguage del cambio") o seguinte a este respeito:
"... o fato de que estas duas" linguagens "existam sugere a hipótese de que cada uma delas corresponde a concepções totalmente diferentes do mundo, porque como se sabe a linguagem, além de refletir a realidade, deve criar uma realidade. Assim vimos as coisas ao longo dos séculos, através da história da filosofia, psicologia, das artes figurativas, religião e mesmo das ciências naturais, cuja objetivitidade ocorre por suposição. Dessa maneira vai se arrastando esta divisão, por vezes mais como uma cisma do que como uma opinião harmônica. Pense-se, por exemplo, na teoria dos tipos de Jung em que se colocam pares diametralmente opostos: Pensamento - Sentimento ou Percepção - Intuição. Nesta teoria são expressas duas formas para conceber a realidade, a saber: um processo que avança passo a passo, com método e lógica, mas que em determinadas circunstâncias "as árvores não lhe deixam ver transversalmente a floresta” e, por outro lado, uma compreensão global e holística da totalidade, das comissurações que enfrentam desvalidamente o singular e o particular, quer dizer, que "não se vê as árvores quando estão no meio da floresta". Parece reservado aos gênios a capacidade de integrar essas duas maneiras antagônicas da percepção ".
O hemisfério cerebral direito possui "uma imagem do mundo", como uma síntese das experiências, convicções e valores. A condensação de uma experiência em uma imagem é indibutavelmente uma função deste hemisfério, de acordo com Karl Jaspers:
“É possível se pensar, não com os conceitos expressos através das palavras, mas pensar com imagens, figuras, mitos, Deuses, paisagens, cores, fenômenos da natureza, nas ações e nas realizações. Todos os conceitos primitivos do mundo são construídos desta maneira, a este tipo de linguagem refere-se posteriormente a linguagem de palavras [...] O pensamento sem linguagem parece ocorrer como o germe a transição. Talvez a coisa decisiva do conhecimento, o salto à coisa nova, o ponto de arranque, original e anticipador se realize no pensamento sem linguagem".
Este parágrafo de Jaspers traduz admiravelmente as imagens da linguagem digital e expressa inexoravelmente as qualidades terapeuticas inerentes à estimulação do hemisfério direito - possibilidade de introspecção, insight e mudança, como pilares da psicoterapia.



A Técnica de Construção de Imagens
É uma contribuição teórica - prática do Dr. Jaime Rojas Bermúdez, usada na etapa de Dramatização do método psicodramático.
J.L.Moreno concentrou-se na dramatização das cenas como potencial terapêutico baseado na experiência e no compromisso total com o papel jogado. Se nós compararmos a cena psicodramática com um filme a imagem seria uma fotografia isolada, extraída no momento mais representativo e com a maior condensação de informação significativa.
Entre Dramatização e Imagem existe duas importantes diferenças qualitativas. Em primeiro lugar, os espaços psíquicos que seguem um ao outro no tempo e que são vivenciados pelo protagonista: na Imagem, os tempos psíquicos são concentrados em um espaço e o protagonista é um observador externo, desde que as formas são fornecidas por Ego-Auxiliares. Seguindo os conceitos etológicos de Kholer, a Dramatização ocorre num campo “mais tenso” no qual o protagonista sente e age. A Imagem permite fazer um exame à distância, em campo "relaxado", destinado à visão e à compreensão estrutural dos fatos e à confrontação da Imagem interna do protagonista com Imagem externa construída e suas influências mútuas.
Imagem com tecidos, representando um momento de coesão grupal.
Na Dramatização tudo é dinâmico: a busca da ligação, a representação de papel, a opção de alternativas e mesmo das técnicas terapêuticas que são aplicadas. Na Imagem se trabalha em contexto estático, com maior colaboração egóica do protagonista e cuidando de examinar as formas e espaços que são refletidos não somente nos atos, mas nos corpos (no caso de Imagem com pessoas).
A técnica de construção das imagens enriquece o trabalho terapeutico com um outro nível de expressão que falta à Dramatização: a imagem simbólica, construída a partir da imagem real ou de uma cena dramatizada. É a imagem dos conteúdos veiculados que Rojas Bermúdez chama de formas naturais (códigos intraespécies que expressam emoções e impulsos) e formas psicológicas (elaborações egóicas que dão lugar a sentimentos e fantasias). A imagem simbólica permite também observar a capacidade de simbolização do protagonista e os elementos que seleciona na imagem real para construir o simbólico.
A técnica de construção das imagens é aplicada na etapa de Aquecimento específico ou após uma Dramatização. O diretor solicita ao protagonista que construa, com Ego-Auxiliares, a reprodução fotográfica de um momento, isto é, que seja na opinião do protagonista representativo de uma situação real ou de uma dramatização precedente; este momento também pode ser escolhido pelo diretor. O Protagonista, de quem o próprio papel foi incorporado pelo Ego-Auxiliar, contemplará a Imagem que construiu à distância, a partir do contexto grupal, embora possa retornar ao Cenário para observar a Imagem em diferentes ângulos e distâncias. No exemplo da imagem simbólica o processo é mesmo, mas o diretor pede ao protagonista que construa uma imagem do que sente ou fantasia neste momento em relação à questão; é mais uma escultura alegórica do que uma fotografia da situação, mais uma criação do que uma reprodução.
Imagem de uma Tenda, construída por um grupo.
Dramatização de cenas, Imagem real e a Imagem simbólica podem seguir uma a outra em qualquer ordem cronológica, de acordo com a conveniência ou ponto de vista do diretor. Neste aspecto nós recordaremos aqui como esquema referencial um conceito etológico de Von Uexkül: a iluminação de campo. Em um estado de apetência, instinto e estímulo se encontram num mesmo campo ou corrente, ao qual o animal recorre, guiando-se pela própria atenção seletiva em relação aos sinais relacionados ao objetivo da meta. Este padrão operativo é confirmado na pragmática do comportamento humano no espaço terapêutico, equiparando-se "instinto" com necessidade ou intencionalidade, e "objetivo" com conflito e resolução. Neste sentido, a dramatização das cenas com sua dinâmica, permitirão seguir a "iluminação de campo", mas as interferências e os bloqueios emocionais podem extraviar o Protagonista desta rota, acontecendo o mesmo com a "iluminação paralela" que a unidade funcional terapeutica persegue. A Imagem, carregada de sugestões em suas formas, espaços e tensões, pode mostrar o sinal característico do campo (sexual, agressivo, defensivo, etc.) e sua orientação e sentido irá permitir a avaliação correta de alguns sinais significativos do campo.
A técnica das imagens é indicada também quando o diretor deseja "desaquecer" um estado excessivamente implicado do protagonista, ou seja, quando este emerge durante o aquecimento ou ao jogar-se determininado papel na dramatização. A proposta para construir uma imagem é dirigida ao Eu e às suas faculdades intelectuais, e o papel do "construtor" externo ao trabalho, favorece a retração do Si Mesmo Psicológico e a recuperação de suas funções egóicas.
A imagem simbólica, com exceção de seu uso com base nas considerações precedentes, indica-se quando o protagonista emerge temporariamente com temática ambígua ou abstrata que não se conecta espacial e temporalmente com referência a uma situação real. Certas verbalizações do paciente como “sinto angústia” ou “algo não funciona entre nós dois” podem recomendar a construção de uma imagem simbólica.
Com a frase simples "você pode construir uma imagem disso?", o diretor estará levando o protagonista a um processo que requer:
a) Busca de uma imagem interna.
b) Espacialização dessa imagem.
c) Percepção das figuras a partir de diversos pontos.
d) Compreensão de conjunto da questão e da sua estrutura.
e) Às vezes leva à compreensão da totalidade, baseando-se em uma parte, ou se divide (por exemplo, um gesto expressivo).
f) Simbolização
Como vimos no começo deste artigo, todos estes elementos são patrimonio do hemisfério cerebral direito (HD), por isso podemos afirmar que a técnica da construção das imagens conduz, em seu primeiro estágio, a uma mudança autêntica no sistema de respresentação (interna e externa) do pensamento. Antes de introduzir as primeiras noções de modificação terapeutica com a técnica, a consigna do diretor já é em si, uma proposta de mudança e solução alternativa. A elaboração posterior que o protagonista faz, por se mesmo ou com a ajuda do diretor e do auditório (platéia) permitirá a reintegração dos dois hemisférios, no qual a troca de informações acontecerá e será coordenada por ele. O protagonista adquire assim, com a recuperação de uma função egóica, um instrumento de introspecção, expressão e compreensão de grande riqueza e flexibilidade.
Dentro da técnica da construção das imagens, assinalamos os principais elementos de desenvolvimento e elaboração:
1) passagem da Dramatização da cena à imagem real, a fim facilitar a compreensão e a elaboração dos fatos e para tomar distância de um papel excessivamente implicado.
2) passagem da Dramatização ou da imagem real à imagem simbólica, a fim demonstrar os conteúdos e/ou para obter um grau maior de relaxamento e objetivação.
3) passagem da imagem simbólica à imagem real, de modo que o protagonista possa relacionar suas emoções, fantasias, medos e desejos com as situações reais e possa descobrir seu próprio código de sinais.
4) passagem da imagem real ou simbólica a Dramatização da cena, a fim verificar as mudanças possíveis na estratégia do protagonista, com base na coisa apreendida na imagem, ou para fazer-lhe vivenciar algum aspecto da mesma.
5) incorporação sucessiva de todos os personages da imagem pelo Protagonista (seguindo da menor implicação à maior), e verbalização do Solilóquio de cada parte. Para esta técnica a consigna do diretor pode ser: "a partir deste personagem, de sua situação, posição e gestos, você diria que sente e pensa... comece falando na primeira pessoa: eu...".
6) construção posterior da imagem precedente ou posteror à situação real colocada, até ter o número suficiente de quadros que permitam esclarecer a dinâmica dos fatos por meio da seqüência de imagens construidas. Este desenvolvimento também pode transformar-se em imagem simbólica.
7) trabalhando com imagens reais ou simbólicas, e indicando um período de tempo determinado para a Construção de uma imagem do passado e/ou do futuro provável (se tudo seguir como agora, como ficará?) pode-se comparar os demais quadros com a primeira imagem e verificar os elementos de mudança.
8) Colocar uma imagem em movimento, se as circunstâncias de tensão e desequilíbrio dos Ego-Auxiliares permitem um movimento automático ou refletido, não voluntário, ou se a tendência das formas corporais for muito manifesta; se o movimento não estiver já potencial na imagem, o papel do protagonista pode ser incorporado por ele mesmo para preceder a dinamização.
9) Com base nas possibilidades comuns, estabilidade e deslocamento do corpo e tendo como princípio tornar os movimentos mais naturais, simples e diretos, verificar as possibilidades de mobilidade e dificuldades para mover-se de uma imagem para a outra, ambas construidas previamente. Pode fazer-se, por exemplo, entre a última imagem e a imagem do presente, ou entre esta e a imagem do futuro "provável" ou "ideal", uma imagem do "conflito" e uma imagem da "solução" deste.
10) Pedir ao protagonista que escolha um novo Ego-Auxiliar para colocá-lo em posição expressiva dentro da imagem, no lugar de um espaço, de um objeto, de um conceito ou de uma parte de Eu de um personagem que o diretor julgar significativo, com base nas explanações do protagonista (se o elemento que será adicionado terá uma definição concreta ou abstrata, isto deve ter sido verbalizado pelo próprio protagonista, quer dizer, deve pertencer ao seu mundo interno e não, há alguma hipótese do diretor; este, no máximo pode perguntar "o que haveria em algum lugar determinado da imagem "?. Assim, o novo Ego-Auxiliar pode corporalmente representar "à distância", a "tensão entre dois personages” seja este "uma árvore", "o medo", "o consciente", etc..
11) A elaboração da imagem com o Auditório contribui não somente com o protagonista, mas também oferece elementos inestimáveis ao diretor permitindo:
O enriquecimento da informação em relação às formas que aparecem na imagem.
Estimar a capacidade terapêutica do grupo.
Verificar a importância do Auditório como representante da rede social em que vive o protagonista.
As representações do Ego-Auxiliar podem ter uma significação especial a parir do papel incorporado na Imagem e também como membro escolhido do Contexto Grupal.
Forma e Conteúdo
Aparência - Essência, Continente - Conteúdo, Explícito – Implícito, são componentes inseparáveis da realidade perceptual. A Forma, sem negar o Conteúdo, além de ampliá-lo representa o triunfo sobre o caos, esta é a base das civilizações e da sobrevivência da espécie e do indivíduo. O Conteúdo sem a Forma explode ou se dispersa (e assim examina um determinado nível da forma). A Forma permite destacar o vínculo e remete-lo à sua organização.
Em sentido gestáltico a forma é toda a estrutura que se recorta de um fundo que está menos indiscriminado e possui as qualidades de significação, pertença, etc.. A leitura das formas em Psicodrama é baseada no seu aspecto perceptivo, nos elementos definidos pela teoria Gestalt, por outro lado totalmente confirmada. Na imagem psicodramática, a forma - figura - gestalt não é unicamente a totalidade da construção emergindo sobre a indiscriminação da cena, mas unidade significativa e totalmente expressiva por si mesma: do gesto de uma mão ao conjunto plástico de todo o corpo ou de um jogo de corpos; desde um espaço limitado a um espaço sugerido; desde uma tensão acumulada a uma ação manifesta:
FORMA E FILOGÊNESE: O biológico (figura) que emerge do inorgânico (fundo) poderia ser a primeira grande forma da filogenética. Depois talvez o pensamento recortando o ser humano do reino animal. Todos os recortes sucessivos (disposição bípede, organização, técnica, etc.) constituirão a história da espécie, a conquista de suas próprias formas. As características anatômicas, o sistema de relações, a organização para a sobrevivência e estrutura do ecosistema levarão à grande diversidade das culturas; porém, as Formas Naturais, que descreveremos mais adiante, transmitidas geneticamente, preservarão o código de reconhecimento intraespécies.
FORMA E ONTOGÊNESE: A primeira forma ontogenética é dupla: o óvulo, esferico, receptor, permanente e sedentario, e o espermatozoíde fibrilar, emissor, efêmero e nômade. Este teste padrão formal se manterá na anatomia e na funcionalidade dos aparelhos genitais, feminino e masculino, e inclusive nos modelos psicoespaciais de sedução e conquista. A interconexão das formas complementária óvulo - espermatozóide, com a conseqüente interrelação de conteúdos, produzirá uma nova forma do embrião, pelo princípio de que o todo é maior do que a soma das partes. O embrião passa a ser conteúdo do útero materno, que a natureza dispõe como forma estável, contenedora e modelo, a primeira Forma - padrão que se oferece ao ser humano em sua existência intrauterina. Esta forma, e seu prolongamento através do canal uterino no parto, serão os modelos que levarão J.L.Moreno a definir a Matriz da Identidade como habitat vital e a Catarse de Integração como o modelo da espontaneidade, mudança e tratamento. A partir do nascimento, o ser humano enfrenta a tarefa de discriminar a confusão mediante o registro experimental das formas, em um contexto psicofisiológico. Mais tarde, e por meio do Eu, dedicará o resto de sua vida à aprendizagem, elaboração e adequação das formas, a fim obter seu equilíbrio num campo vital cujas extremidades são a sobrevivência e a experiência.
Cérebro trino
FORMA E FISIOLOGIA: Os órgãos e os sistemas internos do corpo humano constituem um conjunto de Formas com enorme potencial analógico no psiquismo, que recebe configurações e dados funcionais dos sistemas interoceptivo, exteroceptivo e propioceptivo. Assim, após estimulações corporais intensas ou no caso de alterações patológicas, as imagens oníricas durante o sonho podem constituir disposições espaciais que reproduzem a forma dos elementos corporais estimulados ou alterados. Esta analogia se faz patente ao construir ditas imagens ou dramatizar sonhos em uma sessão de Psicodrama.
FORMA E SOCIEDADE: A forma está determinada no social. A sociedade, qualquer sociedade, se basea em um acordo de formas reconhecíveis, admitidas ou condenadas por meio da separação: rejeição, isolamento, exílio, hospitalização, prisão ou pelo aparecimento de formas ou padrões não pautados em formas aceitáveis. No nível do estado, os governos são organizados com tal grau de formalização que, pela acumulação de formas sobre formas se chega a perder a essência dos conteúdos. A semântica legislativa, a estatística administrativa, a retórica parlamentar; o caso exclusivo do uso do hemisfério cerebral esquerdo, em resumo, conduz a uma política que pode afrontar eficazmente os problemas das cidades, não operando em conteúdos como a fome, a agressividade e solidariedade afetiva.

O Enquadre é a Forma manifesta para o paciente, representa uma peça estável do campo formal para manejar conteúdos; por essa razão, é um elemento integral que Bermúdez chama "modelo" de estruturação de um papel, quer dizer, todas as circunstâncias contemporâneas do trabalho específico de aprendizagem. A aprendizagem de Papéis é uma técnica própria do Psicodrama, porém em qualquer orientação psicoterapêutica pode afirmar-se que o paciente faz uma aprendizagem do papel saudável, ou melhor, de autonomia e independência. Assim, o conceito moreniano de zona é importante, pois nos leva a incluir, no desenvolvimento e na decodificação do processo terapêutico as Formas que surgem da estrutura terapêutica. O contrato, a administração de teste, o retorno do diagnóstico, a exposição dos objetivos, o custo, o controle do tempo, a puntualidade, a disposição espacial dos corpos e objetos, a distância física do terapeuta, os elementos expressos pelo paciente que são ou não tomados para investigação e desenvolvimento, o próprio " estilo comunicacional" do terapeuta e, inclusive, sua imagem de mundo e sua filosofia de vida, são formas - modelo de inegável influência na psicoterapia.

Neste sentido, os papéis serão as Formas do Eu, e o Vínculo uma Forma "contractual" que contém as pautas comuns, uma Forma - espaço compartilhado com as concepções respectivas de mundo de relação.
Para possuir um si mesmo psicológico, limite psiquico autêntico do ser humano, no qual o eu seria a parte discriminada, há ainda uma reação sensorial conectada com o sistema neurovegetativo, que estabelece o limite entre o espaço e a Forma, facilmente detectável em cada momento.

FORMA E PSICOPATOLOGÍA: O sintoma é uma forma, o síndrome é um conjunto de formas. A esquizofrenia é Forma referida a um conjunto de formas. A psicose é um conjunto de formas referidas a conjunto de formas. É evidente que o terapeuta só pode operar aplicando formas sobre as formas do paciente; o perigo não está nisso, mas em definir, classificar e agir com base neste “enquadre” do hemisfério cerebral esquerdo. As quatro linhas acima deste parágrafo podem ser chocantes se observarmos apenas a sintaxe e a semântica, ou a “forma escrita”, isto é, se forem lidas unicamente com o hemisfério esquerdo. Mas, se nos apoiar-nos no hemisfério direito e criarmos uma imagem destas frases, a estrutura em sua superfície será desobstruída e muito mais clara e operacional que a linguagem obtida com o discurso linear e sucessivo. Além disto, na imagem nós recuperamos um elemento básico de todo processo psicoterapêutico: a forma autêntica do paciente, seu olhar, seu gesto, sua posição, seus espaços, suas tensões e a ressonância disso em nossos próprios pólos psicopatológicos, que às vezes é determinante para a compreensão e a empatia com o paciente.
Resumindo: Forma, sintoma, psicose e etc. são palavras convencionalmente usadas na linguagem digital. A verdadeira forma está na Imagem.
FORMA E PSICODRAMA: Na sessão de Psicodrama é oferecido ao grupo uma primeira forma: o enquadre que ordena o confusional e o fantasmático de um contexto terapêutico, discriminando espaços, épocas e instrumentos. No Aquecimento, aparecem como estímulos formas verbais ou corporais. O protagonista emerge como forma recortada dos demais. O diretor convida àquele que constrói formas na cena e passa a incorporar a forma daquele conjunto ao qual se ajustou. O Ego - Auxiliar jogará a forma complementar, e poderá lhe apresentar diferentes formas até que se definam Papéis e Vínculos. O diretor verifica assim suas hipóteses ou descobre outros conteúdos, e pode introduzir as técnicas, que também são formas. Com esta explanação se quer dizer que a mudança em seu sentido mais geral não é mudança de conteúdos, mas mudança das formas. Neste sentido o Catarse de Integração de J.L.Moreno pode ser compreendida como uma forma adaptado a seus conteúdos, o nascimento.
4. ESPAÇO E TEMPO
A construção das imagens é basicamente a construção de espaços. Espaços personalizados ou projetivos. O espaço é discriminado, redefinido e significado com suas massas, tensões e sentidos. Os interespaços entre as Formas vão conter potencialmente a dimensão da coisa negada, temida e desejada e também a dimensão da coisa possível, da alternativa de mudança. A saturação da forma não está no corpo, mas no espaço; corpo e espaço configuram a totalidade da forma.
Na imagem, o tempo está detido mas não congelado, embora tenso e não acumulado; em uma imagem de grande passividade e relaxamento existe uma condensação do tempo cronificada. A energia não é criada nem destruída, mas transformada. É atuada ou condensada, sempre há energia em um ser vivo (o grifo é nosso –N.T.). Toda imagem contém potencialmente a imagem seguinte à seqüência vital. Parar no tempo permite-nos não somente a inclusão, mas a compreensão do presente, para atuar também no futuro.
SÍMBOLO
Todo o esquema de papéis que pode jogar um indivíduo na vida foi estruturado simbolicamente através dos papéis psicosomáticos. Desde a ingestão do leite materno até o alimentar-se com o olhar, desde a defecação à criação artística, desde a micção até a abstração científica, a capacidade de simbolizar permite ascender à individualização e à maturidade. O símbolo é a alternativa ao sincrético, ao simbólico e à descarga abreativa.
Aos 2 anos de idade, com o controle dos esfincteres, quando surge a palavra "não" e a idéia, instauram-se o símbolo, a capacidade de simbolização (Piaget). A partir de então as operações simbólicas passarão a requerer distância entre sujeito, símbolo e objeto.
ANÁLISE DA IMAGEM
Em seguida, apresento um esquema - guia para a análise de Imagens mediante o processamento dos elementos que, mais ou menos automaticamente, considero em meu trabalho profissional. Não é absolutamente exaustivo é apenas representativo de um sistema pessoal de elaboração:
1. Quanto às Formas
a) Gênesis:
Ø Formas Naturais: inatas, transmitidas geneticamente, como o sistema de sinais intraespecies. Estão sempre presentes na comunicação, não são sempre conscientes, e não são controladas pelo Eu. São classificados em:
Formas naturais anatomofisiológicas (a mão, o rosto).
Formas naturais psicológicas (o sorriso, os gestos da ameaça).
Formas naturais do ambiente social (amamentação, a disposição circular dos grupos, fuga maciça pelo pânico).
Ø Formas sociais: São adquiridas por aprendizagem e apresentam as características da estrutura social correspondente. São patrimônio do Eu sistematizadas em papéis sociais.
Ø Formas Psicológicas: Resultam da elaboração egóica e da dupla informação recebida por parte do núcleo de eu e da estrutura social. Por exemplo, as Formas que expressam sentimentos, mais elaboradas do que as emoções e menos socializadas do que os afetos.
b) Veículo expressivo:
A palavra (no Solilóquio).
Corpo ( posição ou postura, o gesto, a expressão do rosto).
Espaço (distribuição do espaço entre os personages, compartilhamento do espaço).
Contexto (um subterraneo, o alto de uma montanha).
Objetos (uma faca, um pacote; simulado evidente na imagem).
c) Relações:
Simétricas: Baseadas na igualdade e na competição: a confrontação.
Complementar: Baseadas na diferença e na conexão: pranto e consolo.
Analógicas: Baseadas em um elemento formal idêntico como, por exemplo, um braço estendido em uma direção, entre dois ou mais personagens de uma imagem, ou nos personagens de imagens diferentes.
2. ESPAÇO
Altura: personagens deitados, sentados, em pé, em cima de uma cadeira. Expressam temas de depressão - exaltação, passividade - protagonismo, dependência - proteção, submissão - domínio, status, poder, inacesibilidade, megalomania, predestinação, etc..
Distância: personagens com contato corporal, distância inferior ou superior em relação ao comprimento de seus braços, a longa distância. Relaciona-se ao sentimento de pertença aos grupos, interesse, vinculação, distância afetiva, etc..
Direções: direções indicados por um braço, um corpo, uma corrente de corpos, um olhar, etc.. Podem apontar para um elemento atual ou ausente na imagem.
Espaços delimitados: Espaços contornados pelos personagens (um círculo, ou divisão de um elemento da imagem).
Configurações Espaciais: Referem-se não aos espaços sem ocupar, mas às figuras, geralmente geométricas, ao desenho obtido acima de uma linha virtual que siga a posição de um grupo de personagens, como linhas retas, circunferências, triângulos, etc.. Podem representar símbolos de uma situação ou vivência (círculos concêntricos, espirais), potenciais da interação (penetração, choque) para tornar-se equivalente a uma sociometria plástica (estrelas com líder central, triângulo afectivo).
Interespaços: São espaços entre personagens, que não estão ainda claramente delimitados, estão carregados com as tensões emocionais ou afetivas e com os potenciais de ação. São zonas de encontro, sensoriais e psicológicos, densamente povoados pelo medo, desejos, ódios, fantasias, etc.. Podem também representar a distância entre papéis pouco desenvolvidos, como o espaço, às vezes desconhecido ou fóbico, do Encontro e do Vínculo.
3. TENSÃO E MOVIMENTO
Aqui investigamos o tipo e o grau de desenvolvimento motor contido potencialmente na imagem, ou que esteja acumulando a energia (tensão) ou expressando a tensão no espaço (movimento).
a) Tendências formais: Movimento expresso pela posição e pelo gesto.
b) Tensões musculares: Energia acumulada no corpo.
c) Equilíbrio axial: Distribuição de segmentos corporais com respeito à linha central vertical e aos centros de equilíbrio (centro de gravidade na pelvis e equilíbrio centrado nos ombros). Partes do corpo em planos diferentes (torsão).
d) Formas opostoas: Uma mesma forma pode corresponder a conteúdos diferentes; por exemplo, um corpo abaixado pode expressar a submissão ou a disposição ao ataque.
4. SEMIOLOGÍA
a) Elementos simbólicos em uma imagem real: o gesto de uma mão, um objeto, um espaço.
b) Imagem simbólica: veículo predominante de simbolização (partes do corpo, espaço, objetos).
· Grau de simbolização. Capacidade de simbolizar, de afastar-se do concreto para expressar conteúdos. Pode ser avaliado pela comparação com a imagem real precedente, no caso de haver-se construído antes a Imagem simbólica: adição ou eliminação de personagens ou de objetos, uso do espaço, etc.. ou a permanencia dos diversos elementos formais da imagem real ou da Dramatização sob a qual foi construída a imagem simbólica.
· Tipo de símbolos: agressivos, sexuais, mágicos, etc.. Símbolos universais, culturais e pessoais.
5. QUALIDADES DA IMAGEM
a) Simples - Complexa: Avaliação da riqueza expressiva e da organização da imagem: quantidade de elementos interconectados significativamente e os espaços criados perto deles, e também a quantidade de elementos expressos, manifestos e sugeridos, em um único personagem.
b) Estável - instável: Capacidade de uma imagem permanecer no tempo, sem perder as Formas (pelo desequilíbrio ou pela fatiga) nem o sentido. Consideramos uma imagem estável se tiver o "tempo" interno necessário para mantê-la viva e estática, ou seja, se possui um tempo interno que a mantém viva para o observador. A Imagem instável produziria a impressão "do projetor danificado", uma vez que não permanece viva para ser apreendida pelo observador, como imagem seguinte (ou seqüencial).
c) Relaxada - Tensa: Mede a energia ou a tensão necessária para manter a expresividade das formas. As imagens que representam sofrimento, expectativa ou controle seriam logicamente tensos; porém, em imagens mais relaxadas, as interferências, inibições, ocultamentos e bloqueios da espontaneidade podem conter tensão.
d) Flexível - Rígida: Liberdade de movimento, indivídual ou grupal, que se permite à imagem sem alterar substancialmente seu significado (ligações ou vínculos, conteúdos, atitudes, espaços significativos, etc).
e) Aberta - Fechada: Se permite ou não a adição de personagens e elementos materiais e espaciais, sem que o sentido central da imagem seja modificado.
f) Desenvolvida - Saturada: Se o movimento admitir um desenvolvimento técnico da Imagem ( adições de persanagens, dramatização, etc) ou requer continuar com uma outra imagem diferente ou passar a comentá-la com o grupo.
g) Completa - Incompleta: Se estiverem na imagem todos os elementos que especificam o protagonista e todos os dados sugeridos pelas posturas, gestos e espaços colocados, ou há indicações de centros de interesse não representados plásticamente.
h) Harmônica - Disarmônica: A impressão de harmonia, embora dependa da sensibilidade do observador, responde às leis gerais enunciadas na teoria da arte, a composição, o desenho e a psicologia da forma. Uma imagem harmonica reflete saúde, ou ao menos a possibilidade de um manejo fluído do conflito, sem mudanças íngremes.



FONTES:
Texto: Original em espanhol: “El Pensamento em Imágenes”, retirado da Internet sem referência de autoria.
Tradução: Leonídia Alfredo Guimarães
Contato: leonidiaguimas@yahoo.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

HISTÓRIA DO PSICODRAMA: Da evolução do criador à evolução da criação

Reflexão sobre relacionamentos: Crônica de Rubens Alves

Teoria da Espontaneidade do Desenvolvimento Infantil - TEDI